Silas
Corrêa Leite e o seu Tibete particular
Por Marcelo Pereira Rodrigues (MPR)*
Silas
Corrêa Leite é um ser performático. Professor, profícuo escritor, jornalista,
agitador cultural, comentarista político nas redes sociais, comunista e
visionário, seus escritos por vezes se travestem de verborragias e um desejo
muito natural (propício a todo artista que se preze, de aparecer). No bom
sentido do termo. Mas é aí que surge o contraditório: nos tempos atuais, onde
as pessoas se importam mais com a forma do que o conteúdo, em que beldades se
auto intitulam atrizes e onde youtubers colecionadores de likes viram
celebridades e consequentemente escritores, qual o espaço para verdadeiros
escritores, de almas atormentadas, desses que escrevem com sangue, como bem
sugerido por Friedrich Nietzsche (1844-1900)? Pois este é o dilema de Silas, a
partir da leitura que fiz de Tibete, de
quando você não quiser mais ser gente. Com uma advertência na capa: Destruam este diário ou destruam suas vidas.
Publicado pela Jaguatirica, em 2017, o livro possui 381 páginas.
Na
obra, um homem se retira do mundo e vai viver em um sítio em Itararé – SP.
Através de um cotidiano ordinário, vai purgando as suas angústias e sobressai o
lirismo de versos bem construídos, letras de músicas que evocam a Raul Seixas,
chistes e aforismos poéticos que fazem da leitura um exercício prazeroso, pois
a diagramação da obra é bastante convidativa. À medida em que vamos
acompanhando o cotidiano deste matuto, vamos subindo as nossas montanhas e
estranhando o povo que insiste em ficar na planície. Metáfora do excepcional A Montanha Mágica, de Thomas Mann? Se
não temos a verticalidade do sanatório de Davos, a horizontalidade do sítio, o
amor do homem pelos bichos de estimação e os cuidados com os afazeres práticos
nos conduzem pela mão, como a mostrar generosas relações interpessoais, quando
acontecem. O sujeito estranho a este mundo faz o seu diário com trocadilhos, e
tem uma visão aguda sobre a corrupção das pessoas. Faca quente cortando a
manteiga. O ermitão sabe bem dar o seu recado. Pessoalmente, esse cenário rural
me é familiar, e como escritor apresentei ao mundo das letras Arioswaldo,
personagem do romance O Filósofo Idiota.
Como
toda excelente obra, Tibete... não é
conclusiva, e me deixou com a pulga atrás da orelha, e assim pretendo
continuar, sobre ser o matuto o alter ego
do escritor. Tudo isso devido ao nome Ivo Gabriel Moura Scarpelli. Por favor,
autor: não me esclareça! Entre a vida e a arte, escolha a verdade da arte, como
bem indicado por Oscar Wilde (1954-1900). Adendo: verdadeiramente, o ano de
1900 foi detestável: perdemos dois gênios. Nietzsche e Wilde.
Que
o autor continue com a sua subida (vertical ou horizontal), que escreva para
continuar purgando seus sentimentos e que encontre bons leitores. Certamente os
do q da qualidade em detrimento aos q da quantidade, pois, como sentenciado por
Nietzsche: “Alguns nascem póstumos! ”.
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Marcelo Pereira Rodrigues (MPR) é
filósofo e escritor, autor de 12 livros, tendo publicações no Brasil, Portugal,
Espanha e América Latina. Editor da Revista Conhece-te, que existe há 18 anos e
meio com periodicidade mensal.
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